Posso meditar sozinho?
Não há nada que impeça alguém de começar a praticar meditação sozinho. É necessário ter um conhecimento razoável dos ensinamentos do Buda e com base nos textos disponíveis sobre meditação é possível ter uma idéia geral sobre como funciona a prática. Havendo oportunidade é recomendável que o meditador tenha o apoio de pessoas mais experientes e que participe de retiros de meditação para obter mais experiência e contar com o auxílio de um professor.
No entanto, há dois obstáculos que são enfrentados por todos os meditadores. Primeiro é a motivação e segundo, como lidar com as dificuldades que surgem.
No entanto, há dois obstáculos que são enfrentados por todos os meditadores. Primeiro é a motivação e segundo, como lidar com as dificuldades que surgem.
A meditação como qualquer arte ou esporte requer continuidade na prática. Certo maestro de uma orquestra sinfônica dizia que se um músico da sua orquestra ficasse três dias sem praticar, a audiência perceberia; se ele ficasse dois dias sem praticar, os seus colegas na orquestra perceberiam; e se ele ficasse um dia sem praticar, ele, maestro, perceberia. Com a meditação é a mesma coisa. É necessário incorporá-la como parte da rotina diária, assim como escovar os dentes ou ir ao banheiro. Para fazer isso, no entanto, é necessário motivação. Num retiro de meditação, onde há um grupo de pessoas e uma rotina de atividades estabelecida, fica mais fácil manter a disciplina. Em casa, sozinho, é muito mais difícil. A pessoa tem de encontrar dentro de si mesma essa motivação. Desenvolver um senso de urgência, (samvega em Pali), é um dos principais fatores que ajuda a estimular a energia para a prática da meditação. Esse senso de urgência é despertado ao refletirmos sobre as inevitáveis vicissitudes da vida e o sofrimento gerado pelas enfermidades, envelhecimento e morte. O estudo, a leitura de textos Budistas pode servir como fonte de inspiração, e a participação num grupo que medite regularmente também pode ajudar. Ayya Khema dizia que as pessoas com tendência para aversão são aquelas que são motivadas com mais facilidade para a prática, porém são aquelas que provavelmente, pela própria aversão, irão encontrar mais dificuldades.
O segundo aspecto é como lidar com as dificuldades. Não que a meditação seja algo difícil. A meditação em si é muito fácil. As dificuldades são em geral criadas por nós mesmos devido aos
hábitos mentais inábeis acumulados durante muito tempo. Isso é o que cria as dificuldades na meditação.
hábitos mentais inábeis acumulados durante muito tempo. Isso é o que cria as dificuldades na meditação.
Qualquer prática de meditação terá mais chance de ser bem sucedida se for acompanhada por uma sensação de bem-estar mental. Isso não só cria um fator de estímulo para praticar a meditação, como é também a condição necessária para que a meditação transcorra com menos dificuldades. O objeto de meditação mais recomendado é a respiração, que inclusive foi o que o próprio Buda empregou. A respiração tem a vantagem de ser algo neutro, mas ao mesmo tempo capaz de condicionar a mente e o corpo. Dependendo da forma como a respiração é observada, ou seja, o tipo de atenção e intenção na mente ao observar a respiração, combinado com um ritmo de respiração que seja confortável e agradável, é possível com facilidade criar essa sensação de bem-estar no corpo e na mente. Esse será um bom ponto de partida, ao qual poderemos sempre recorrer.
Além disso é importante, como base para uma meditação bem sucedida, que o meditador observe certas regras de conduta, cujo conteúdo mínimo abarca os cinco preceitos e o ideal, a Ação Correta, a Linguagem Correta e Modo de Vida Correto do Nobre Caminho Óctuplo. A observação dessas regras de conduta visa evitar o remorso e a agitação mental e com isso, contribuir para o ambiente de bem-estar e tranqüilidade da mente.
Mas mesmo tomando todas essas precauções, é inevitável que as dificuldades surjam, e nesse aspecto, uma pessoa mais experiente pode ajudar bastante evitando que o meditador perca tempo em demasia com problemas de fácil solução. Por outro lado, o meditador tem de estar preparado para emoções fortes que podem se encontrar contidas dentro da mente e que devido à prática da meditação encontrem uma forma de vir à tona e assim impossibilitar que a mente se tranquilize. Nesse caso, o mais prudente é descontinuar a prática da meditação até que ele receba instrução adequada de como lidar com esse aspecto da prática, e para isso a ajuda de um meditador mais experiente ou de um professor será necessária, pois se essa emoção for demasiado intensa e perturbadora, a prática da meditação poderá alimentá-la.
No entanto, há algumas dificuldades que o meditador irá enfrentar e para as quais ele mesmo terá de encontrar a solução, pois as experiências das pessoas variam muito e nem sempre um meditador mais experiente, ou um professor, terá uma resposta satisfatória. Mesmo que o professor tenha tido uma experiência semelhante, as soluções para as dificuldades na meditação podem variar de pessoa para pessoa. Nesses casos o meditador terá que agir como seu próprio professor, ser aluno e professor ao mesmo tempo. Para conseguir isso é necessário ser muito observador e estar disposto a fazer experimentos, tentar diferentes alternativas para avaliar o resultado, é dessa forma que o meditador irá conhecer melhor a sua mente. O importante é não ficar frustrado com as dificuldades que forem encontradas, lembrando sempre que a paciência e a equanimidade são qualidades mentais importantes e que são justamente as dificuldades que fazem com que elas amadureçam.
Lembro de uma história do Ajaan Mun, um dos fundadores da tradição de florestas da Tailândia, que no início da sua carreira como monge, perambulando pelas florestas da Tailândia, ao meditar, com a mente concentrada, tinha a visão de um cadáver e não sabia bem o que fazer com aquilo. Ele recorreu ao seu companheiro monge para pedir ajuda mas este foi incapaz de ajudá-lo, pois as suas experiências meditativas eram completamente distintas. Ajaan Mun teve de encontrar a resposta sozinho através da própria perspicácia. Através da sua determinação e esforço Ajaan Mun acabou se convertendo num dos mais renomados mestres de meditação na Tailândia no século XX. Para aqueles que o conheceram Ajaan Mun era um iluminado. A tradição que ele estabeleceu se mantém viva até os dias de hoje, não só na Tailândia, mas em vários monastérios estabelecidos pelos seus discípulos em muitos países da América do Norte, Europa e Oceania.
Uma pessoa com a mente instável,
sem compreender o verdadeiro Dhamma,
com a serenidade à deriva:
a sabedoria não chega à sua plenitude.
Dhammapada 38
sem compreender o verdadeiro Dhamma,
com a serenidade à deriva:
a sabedoria não chega à sua plenitude.
Dhammapada 38
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