sexta-feira, 13 de maio de 2016

Papa Francisco

Filipe de Neri e a galinha

· ​Missa em Santa Marta ·

Um bom «freio na língua» quando nos acomete a tentação de bisbilhotar. Porque precisamente «os semeadores de joio» — como denominam na Argentina as pessoas que põem bisbilhotices em circulação — são um contratestemunho cristão e chegam a causar até divisões na Igreja. Contra este modo de agir, infelizmente muito difundido no âmbito eclesial, alertou o Papa na missa celebrada na manhã de 12 de maio, na capela da Casa de Santa Marta.
«Jesus reza: “Elevai os olhos ao céu, orou”», narra João no trecho evangélico (17, 20-26) proposto pela liturgia do dia. E Francisco observou que «Jesus rezou por todos, não orou só pelos discípulos que estavam à mesa com ele, mas por todos». Com efeito, escreve João citando as palavras: «Não rogo só por estes, mas também por aqueles que crerem em mim, através da sua palavra». Isto quer dizer, afirmou o Pontífice, que Cristo «reza por nós: orou por mim, por ti e por cada um de nós». E não cessou: «Jesus continua a fazê-lo no céu, como intercessor». É importante compreender «o que Jesus pede neste momento ao Pai: “Para que todos sejam um só; como tu, Pai, estás em mim e eu em ti”, que também eles estejam em nós». Com efeito, Ele «crê e reza pela unidade, pela unidade dos crentes, das comunidades cristãs». Mas pensa «numa unidade como é aquela que ele tem com o Pai, e o Pai com ele: uma unidade perfeita». E assim conclui a sua prece, segundo o Evangelho de João: «Para que o mundo creia que tu me enviaste». Eis porque «a unidade das comunidades cristãs» e «das famílias cristãs» é «o testemunho de que o Pai enviou Jesus».
Francisco disse que está consciente de que «uma das coisas mais difíceis talvez seja chegar à unidade numa comunidade cristãs, numa paróquia, num episcopado, numa instituição cristã, numa família cristã». Infelizmente, insistiu, «a nossa história, a história da Igreja faz-nos envergonhar muitas vezes: fizemos guerras contra os nossos irmãos cristãos, pensemos numa, na guerra dos trinta anos». Mas Jesus «diz outra coisa: “Se os cristãos fazem guerra entre si é porque o Pai não enviou Jesus, não há testemunho”». Por nossa vez, disse, «devemos pedir muito perdão ao Senhor por esta história; uma história muitas vezes de divisões e não só no passado mas também hoje». E «o mundo vê que estamos divididos e diz: “Que eles se ponham de acordo, depois veremos, mas como, Jesus ressuscitou e está vivo, e os seus discípulos não se põem de acordo?”».
«Nem sequer na Páscoa estamos unidos!», insistiu Francisco. A tal ponto que, «certa vez, um cristão católico perguntava a um cristão do Oriente, também ele católico: “O meu Cristo ressuscita depois de amanhã, e o teu quando?”». E no final «o mundo não crê».
Nesta altura, o Papa perguntou como entram «as divisões na Igreja?». E a resposta foi um convite a esquecer por enquanto «esta grande divisão entre as Igrejas cristãs» e ir, por exemplo, diretamente às «nossas paróquias». O problema, observou Francisco, é que «o diabo entrou no mundo por inveja, diz a Bíblia; foi a inveja do diabo que fez entrar o pecado no mundo». Assim «há o egoísmo, porque quero ser mais do que o outro e muitas vezes — diria que é quase habitual nas nossas comunidades, paróquias, instituições episcopados — encontramos divisões fortes que começam precisamente com os ciúmes, a inveja, e isto leva-nos a falar muito mal uns dos outros». E evocando um modo de ouvir habitual nas paróquias, «na minha terra é muito comum», o Papa revelou: «Uma vez ouvi estas palavras num bairro: “Não vou à igreja porque, olha para aquela, vai todas as manhãs à missa, recebe a comunhão e depois vai de casa em casa a falar mal: para ser cristão assim prefiro não ir, como aquela bisbilhoteira». E prosseguiu: «Na minha terra estas pessoas chamam-se “semeadoras de joio”: lançam joio, dividem, e as divisões começam com a língua por inveja, ciúme e fechamento». O «fechamento» leva a afirmar: «Não, a doutrina é esta...».
A propósito o Papa recordou que, no capítulo 3 da sua carta, o apóstolo Tiago diz: “Somos capazes de pôr o freio na boca do cavalo! Até um navio com um pequeno leme pode ser guiado e nós não conseguimos dominar a língua?». Porque a língua, escreve Tiago, «é um pequeno membro mas vangloria-se de fazer grandes coisas». E «é verdade», confirmou o Papa: a língua «é capaz de destruir uma família, uma comunidade, uma sociedade; de semear ódio, guerra e inveja». E voltou a propor as palavras da prece de Jesus: “Pai, rogo por aqueles que crerem em mim, para que todos sejam um só, como eu e tu”». Mas «quanta distância» há entre a oração de Jesus e a vida de «uma comunidade cristã habituada a bisbilhotar». E é «por isso que Jesus roga ao Pai por nós».
Então, convidou a «pedir ao Senhor a graça, a força para que nas nossas comunidades não haja tais situações». Mas, sugeriu o Pontífice, «Jesus diz-nos como devemos ir em frente quando não estamos de acordou ou algo do outro não nos agrada: “Chama-o, fala!”. E se o teu interlocutor «não entende ou não quer entender, chama uma testemunho e faz o papel do mediador». Jesus «ensinou-nos» este estilo. Mas «é mais fácil falar mal e destruir a fama do outro».
Para tornar ainda mais concreta e insistente a sua meditação, o Papa narrou um episódio da vida de são Filipe de Neri. «Uma mulher confessou que tinha bisbilhotado». Mas «o santo, que era alegre, bom e generoso, disse-lhe: “Senhora, como penitência, antes de lhe dar a absolvição, vá para casa, pegue numa galinha, arranque as suas penas e depois saia pelo bairro, lance por toda a parte as penas da galinha e depois volte aqui”». No dia seguinte, acrescentou, «a senhora voltou: “Fiz aquilo, padre, dá-me a absolvição?». Eloquente a resposta de são Filipe: «Não, falta outra coisa, senhora, vá pelo bairro e recupere todas as penas», porque «falar mal é assim: sujar o outro». Com efeito, acrescentou o Papa, «quem fala mal, suja, destrói a fama, aniquila a vida e muitas vezes sem motivo, contra a verdade». Eis que «Jesus rogou por nós, por todos nós que estamos aqui e pelas nossas comunidades, paróquias e dioceses, “para que sejam um só».
Concluindo, Francisco exortou a rezar «ao Senhor para que nos conceda a graça», porque «é grande a força do diabo, do pecado que nos impele às divisões, sempre!». É preciso dirigir-se ao Senhor a fim de que «nos dê a graça, o dom que faz a unidade: o Espírito Santo», continuou, desejando «que nos conceda este dom que faz a harmonia, porque Ele é a harmonia, a glória das nossas comunidades». E que «nos dê a paz, mas com a unidade». Por isso, «peçamos a graça da unidade para todos os cristãos, a grande graça e a pequena graça de cada dia para as nossas comunidades e famílias». E inclusive «a graça de pôr o freio na língua!».
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